O campo de respiração

“Inspiração”: Toda vida humana começa com uma inspiração profunda, seguida normalmente de um grito forte. A vida de cada um de nós – assim dita autônoma – depende totalmente da respiração. Da mesma forma que a Terra é envolvida por uma camada de ar ou atmosfera, nós também vivemos em nossa pequena atmosfera ou campo de respiração. Esse campo de respiração microcósmico é um campo de vida, uma atmosfera astral muito pessoal, cuja estrutura e função são exatamente as mesmas que as do grande campo de respiração cósmico.

O sopro, o alento, conduz tudo à vida, a uma transformação constante, a uma metamorfose contínua. Essa força de vida misteriosa é conhecida desde sempre e é chamada prana pelos hindus, pneuma pelos gregos; os chineses a denominam chi e os romanos, spiritus vitalis, para designar essa essência vital em todos os níveis de expressão da vida em si.
A respiração, o alento, regula a estrutura da matéria e também sua deterioração. Mas também a transição para um novo nível vida, mais elevado. Ou, como o descreveu poeticamente um botânico inspirado pelo taoísmo: “Toda a paisagem exterior simboliza a paisagem interior do homem. Tudo faz parte de um mesmo processo cósmico natural. É, ao mesmo tempo, um processo espiritual de cima para baixo inspirado pelo chi, do qual o cosmo inteiro participa e no qual o homem ocupa um lugar modesto, embora ele possa se integrar a esse processo com a alma e o coração, de maneira que toda a separação entre o grande e o pequeno desaparece”.    
Esse botânico sustentava que: “Assim como as grutas profundamente escondidas na paisagem se abrem para o espaço imenso, a libertação e a imortalidade jazem no segredo do homem interior”. É sempre essa aparente contradição que carrega em si mesma o milagre do Um, o milagre da possibilidade perfeita da libertação, o milagre de um caminho que vai cada vez mais longe, o milagre de uma esfera de vida infinita. J. van Rijckenborgh, contudo, diz em sua análise do Nuctemeron, de Apolônio de Tiana: “Não existe ser humano dialético ou homem divino que possa subtrair-se ao domínio das forças magnéticas de seu campo de respiração”
Aí está uma afirmação bastante categórica, que nos faz considerar a situação em que nos encontramos a partir da perspectiva do campo respiratório.
Cada ser humano que chega a esta Terra nasce em um campo de respiração – um campo, uma esfera que contém a herança de inúmeras vidas anteriores. Começamos nossa existência em uma magnífica câmara de tesouros, ou mesmo em uma terna prisão – ou dentro de tudo o que possa ser vislumbrado entre esses dois extremos.
Toda atmosfera é determinante. Quando ela é favorável, muito mal pode ser convertido em bem. A qualidade de uma esfera ou de um campo é determinada pelas forças que nela estão concentradas. Desse modo, os Rosa-Cruzes clássicos sabiam que eram protegidos por uma concentração de força ígnea em seu campo de respiração. Eles colocavam seu trabalho conscientemente sob a proteção dessa força, “à sombra de Suas asas”.
Todo ser humano tem a obrigação de respirar. Somente conseguimos prender ou acelerar nossa respiração durante um curto lapso de tempo. Quem tenta forçar uma ou outra situação perde a consciência – e os centros respiratórios assumem o controle. É assim que a respiração se mantém durante o sono ou o coma.
Da mesma maneira, é impossível influenciar a respiração magnética ou astral com nossa vontade. Em uma entrevista, há algum tempo, uma pessoa declarou ter tentado durante anos se desapegar de uma tendência profundamente arraigada, que lhe causava imenso sofrimento.  Ela disse ter chegado finalmente à conclusão de que, nesse nível, não tinha conseguido atingir nada por meio de sua vontade. “A única coisa que podia fazer com minha vontade, disse ela, era tomar a decisão de observar essa tendência para percebê-la o mais objetivamente possível”.
 
Karl von Eckartshausen considerava isso a primeira etapa da “percepção interior”. E essa primeira etapa consiste em prestar extrema atenção e manter interiormente certo afastamento.
O fato de tomarmos distância e consagrarmos toda a nossa atenção pode parecer contraditório. No entanto, essa é a atitude daquele que chegou a um limite, mas sabe que existe um caminho que leva ainda mais longe. Com essa atitude, certa calma se instala no campo de respiração e assim podemos assimilar outras forças magnéticas. Aquele que, nessa calma e com esse comportamento, entra em um Templo da Escola Espiritual, sabe que a ele é dada a oportunidade de assimilar por um momento, a partir do sopro de Deus, o alimento – os santos alimentos de Luz que iluminam o espaço criado em seu campo de respiração e rompem os fios do Destino, criando a harmonia no caos e reforçando a paz em seu ser. O sopro de Deus não é apenas um brilho, uma irradiação. É também uma substância que tudo penetra e que, circulando pelo espaço, é capaz de modificá-lo inteiramente. A consequência inegável disso é que ela modifica igualmente a respiração magnética. Com isso, o campo de respiração se torna mais silencioso e a consciência ganha mais clareza. Todo o trabalho que é realizado nesse local permite que o homem se liberte progressivamente do peso astral. Há cada vez mais espaço para a alma que aumenta em esplendor. Assim, lentamente, mas com vigor, a atmosfera do campo de respiração se modifica.
Karl  von Eckartshausen chama isso de resultado da confluência entre a vida meditativa e a vida ativa. A Escola espiritual nos ensina a “estar sobre o tapete” por intermédio de uma fé inabalável, um desejo intenso e um esforço contínuo. São essas as condições para enfim mudar a respiração magnética e abrir o campo de respiração às forças do campo astral puro. Em um primeiro momento, vivemos em uma atmosfera fechada na qual se produz uma série – aparentemente sem sentido – de construções e demolições, onde parece não haver lugar para onde escaparmos. Porém, quando apresentamos um comportamento de vida meditativo, uma abertura contínua favorável ao aprofundamento, à renovação e elevação, e, quando nossas ações são resultantes dessa atitude de vida que realiza aquilo que contribui para a plenitude e preservação do mundo e da humanidade… então vai descendo até nosso campo de respiração uma atmosfera sutil, cada vez mais etérica – que provém da atmosfera ilimitada do Grande Alento.
Então, acontece a situação descrita por J. van Rijckenborgh em sua análise do Nuctemeron: “O fogo mágico do Universo, de onde dimana a vida, já não precisa penetrar o campo de respiração através do emaranhado fio da teia do destino. Pelo contrário, o fogo, segundo seu objetivo original,entra diretamente no sistema microcósmico do candidato, concentrando-se, perfeitamente puro, no campo de respiração, onde o candidato – respirando com o coração sétuplo purificado – alimenta seu ser com esse fogo hermético.” Aqui é descrita uma situação extremamente misericordiosa, com a qual todos nós podemos nos alegrar e  na qual cada um de nós pode se reconhecer. Então é dado ao homem um fragmento de uma realidade elevada, que o conduz no mais curto caminho possível: o caminho do serviço à humanidade. Essa visão o alimenta e protege por inteiro, pois não é mais sua própria vontade que o anima, mas sim a alma que vive com o Espírito.
Quando é assim que acontece, – não porque nós pensamos ou queremos, mas porque o tempo dos esforços ansiosos se cumpriu – então o campo de respiração se torna um campo santificado e, inevitavelmente, o conjunto de todos os nossos pensamentos, sentimentos e ações será consagrado à plenitude e à salvação do mundo e da humanidade. ◊

Pentagrama no 1 / 2017

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