Caminhando com Paulo

Estar de férias significa, literalmente, manter distância da vida cotidiana, observar tudo a partir de um novo ponto, viver a partir de uma perspectiva diferente. Com frequência se apresenta um olhar mais amplo porque, de repente, em um país distante e estranho, você faz parte de um todo maior e de uma história mais significativa.
 
Se você é europeu, na África do Sul você é o branco. Em Bali, o colonialista. Nos Estados Unidos, o cúmplice. Na Índia, o eterno buscador da eterna sabedoria universal como os outros. E na França ou na Itália você é a parte consciente de um continente que está em busca de sua identidade.
No caminho você pode sentir, de maneira imprevista e evidente, que as pessoas estão todas interligadas, seja como indivíduos ou em grupos. Ao mesmo tempo estão juntas, aprisionadas em um emaranhado bastante confuso. Raças, grupos e países determinam a história e o destino de cada pessoa: às vezes em sentido positivo, mas também em sentido desastroso. Quando viajamos, vemos e ouvimos o quanto homens e mulheres se desgastam por um pouco de felicidade, por um futuro melhor para seus filhos, pelo tipo de vida que faz algum sentido para eles. É assim que, observando e escutando aqui e ali, nos damos conta de que, se existe diferença entre nós, é apenas em relação a condições externas e temporais. Viajando, de repente nos percebemos como pessoas cosmopolitas, cidadãos do Universo. Fica muito claro que estamos todos no mesmo barco! E, com nossos olhos espirituais, também vemos que, atrás de nós, já temos um caminho extremamente longo de uma história comum.
Demorou milhões de anos até que a humanidade como um todo evoluísse para o homem racional – o homo sapiens.  Compartilhamos uma vida em comunidade há apenas algumas dezenas de milhares de anos.
Nesta incrivelmente longa história da humanidade jamais fomos abandonados, mesmo que muitas vezes não conseguíssemos perceber isso. Em todas as épocas difíceis sempre fomos acompanhados por hierarquias superiores veneráveis, que dirigem os processos cósmicos e as fases de desenvolvimento da consciência. De tempos em tempos, mensageiros da Luz sempre vieram até nós trazendo esperança e apresentando perspectivas ilimitadas de campos de vida que nos estão aguardando.
Vários grandes homens do espírito iluminaram nossos caminhos. E nas épocas históricas chegaram até nosso campo de visão impressões da beleza, bondade e verdade divina, que ficaram gravadas em nosso ser através de narrativas, imagens e música.
Em todos os tempos também existiram pessoas preparadas para sacrificar-se pelos outros. Mas agora parece que nesta época moderna – que também já conta centenas de anos – estamos entrando em um período de aceleração e, do ponto de vista temporal, nossa posição está sendo levada ao ponto máximo. Nossa civilização começou há mais de 10.000 anos: é um longo período longo de evolução, um autodesenvolvimento vagaroso.
Mas desde os antigos gregos fomos levados a refletir sobre nós mesmos. Cada vez mais estamos segurando a rédea de nosso destino em nossas próprias mãos. Agora que os líderes desapareceram de nosso campo de visão e os sábios, os grandes, foram para os bastidores, não podemos mais continuar empurrando a responsabilidade para nossos pais, nem para nossos dirigentes, nem para as condições de vida e menos ainda para Deus.
Somos nós que temos de nos tornar adultos! Assim, em nossa plena autorresponsabilidade, iremos ao encontro de nosso próprio ser inalienável e eterno em algum lugar e em algum momento.

Em nossa plena autorresponsabilidade, iremos ao encontro de nosso próprio ser inalienável

O que Bali ensina
Estando de férias em Bali você pode sentir muito bem as diferenças na evolução da consciência. Os balineses são orgulhosos de sua mescla de veneração de antepassados com o hinduísmo tradicional. A religião domina totalmente a vida deles. Todo dia as mulheres ocupam-se horas a fio com o arranjo de oferendas multicoloridas e trançadas com elegância.
Mulheres e homens muitas vezes fazem cerimônias diárias em seus próprios templos domésticos ou nos templos da comunidade para venerar seus antepassados, para orar para seus muitos deuses ou para Brahma.
Todos os dias livres são dedicados a cerimônias. Famílias, comunidades e tradições centenárias determinam como a comunidade pensa e vive. Individualidade e independência parecem ter pouca importância.
Não é improvável que isso venha a mudar dentro de algum tempo previsível. O número de muçulmanos já vem crescendo. É quase inevitável que os muçulmanos praticantes, que se dedicam social ou politicamente à sua crença venham a sobrepujar as tradições balinesas. Os habitantes de Bali precisam fazer uma escolha entre a adaptação e o desaparecimento. Isso é trágico e, caso aconteça, sem dúvida provocará muita perturbação e desgosto, mas, ao mesmo tempo, uma inevitável fase de evolução para o estado adulto – ponto no qual estamos como humanidade. Por um lado, o que se vê em Bali pode nos parecer algo muito distante. Por outro, quando considerado em nível mais profundo, também é válido para nós: trata-se de uma diferença de espirais, pois um intervalo de cem anos não tem a menor importância.
Neste exato momento, todos nós estamos sendo conduzidos através do tempo até o fundamento de nossa existência. As tendências visíveis e perceptíveis da polarização separam as pessoas e grupos para que – mais cedo ou mais tarde – nos reencontremos em um plano espiritual.
Podemos observar processos como esse em nossa própria vida. Como seres humanos ocidentais, individualizados, estamos lutando contra nossas tendências pueris, a angústia, o fato de sermos completamente influenciados pelo mundo e suas potências. Também nós nos defrontamos com temas e questões antiquíssimas que nos põem em contato com sentimentos primais. Estes, muitas vezes, surgem a partir de vivências de insegurança, exclusão, perda e solidão. São sombras e, em grau extremo, repetições de uma vivência maior: a expulsão do paraíso. Carregamos conosco essa vivência fundamental como uma ferida que não cicatriza e como uma grande privação da qual ninguém escapa. Para suportar essa dor deixamo-nos enganar pelas três tentações clássicas: posso, prestígio, poder. “Clássicas” porque, já no notável livro de sabedoria, que é a Bíblia, elas são apresentadas de modo muito fácil de compreender.
Quando optamos por esse caminho, só nos envolvemos cada vez mais, dependendo uns dos outros individual e coletivamente – e é assim que acabamos perdendo o rumo da trilha interior.
Não estamos sozinhos
Quem está vinculado à Rosacruz Áurea, sabe, do mais recôndito de seu ser, que a desunião fundamental só é revogada na medida em que nos ligamos de novo e para sempre com o espírito de Amor e Liberdade que pertencem ao núcleo do microcosmo. Só assim podemos chegar ao amadurecimento sobre o qual fala Paulo em Coríntios I,13:
“No princípio, quando eu ainda era criança, falava como criança, sentia e pensava como criança, mas então me tornei um homem e desisti das ideias de criança. Agora vemos apenas uma imagem vaga como em um espelho turvo. Porém depois estamos diante de Deus. Agora o conhecemos apenas de modo imperfeito; porém depois o conheceremos perfeitamente assim como Ele agora já nos conhece.”
Nesta época muita coisa está caminhando mal das pernas e muitas pessoas estão buscando, quase que em desespero, um novo alicerce. E agora, tendo chegado à base de nossas vidas, descobrimos, como pessoas, que não estamos sozinhos, e que podemos observar isso também está à nossa volta. Aí está aquele fio que nos liga e que nos conduz até a saída! Como um toque sutil, um sussurro meigo ou uma clara resposta ressoa o chamado: “Venha, siga-me.”
Como na citação acima, Paulo dirige-se enfaticamente à nossa fantasia até os dias de hoje, e isso também se justifica. Ele estava preenchido pelo espírito ardente da Verdade e do Amor. Ele vivia fundamentado na Gnosis. Exatamente como vivemos agora ou como, no mínimo, tentamos viver.
Paulo tinha atingido essa condição rara e majestosa do verdadeiro amadurecimento. Por isso, tinha autonomia no pensar e no agir e era incansável em seu anseio de afastar-se de tudo o que não pertence ao centro microcósmico.
Paulo era um renovador corajoso. Mas não tinha orgulho e estava sempre bem consciente de seus próprios limites como ser nascido da natureza. São sinais de amadurecimento. Mas o que, na realidade, marcava a verdadeira majestade de seu estado de adulto não era só o fato de que vivia a partir do conhecimento interior de modo autônomo e consciente, mas o fato de que, ao mesmo tempo, estava profundamente ligado às pessoas a seu redor (sem dúvida porque não podia agir de outra maneira). Relacionava-se com todos os outros sem torná-los dependentes dele. Confiava em sua força anímica e focalizava o que era possível ou o que podia tornar-se possível. Assim também poderia ser nosso vínculo com o ambiente e com os outros! E assim também, às vezes, já é agora, sem dúvida. Não apenas de modo abstrato e também não apenas com aqueles que buscam conscientemente e encontram a Escola Espiritual, mas com cada pessoa que cruza nosso caminho na vida.
Então seremos bons servidores, quando, como Paulo, estivermos vivificados pelo Espírito e independentes, por assim dizer, indivisos e íntegros como que em uma fusão – portanto, quando soubermos isso a partir do coração, e reconhecermos o mesmo simultaneamente com a cabeça e assim conseguirmos viver a partir de tal entendimento clemente e salutar. Essa certeza interior nos basta e ainda tem muito a nos dizer. Seremos bons servidores quando, com base nesse estado de ânimo livre e inspirado, estivermos atentos ao nosso ambiente e a cada pessoa com que nos encontramos para, então, conviver realmente com elas – o que significa apoiá-las e ver o que é possível. Esse momento exige de nós a máxima presença para colocarmos os valores das outras pessoas acima de tudo. Isso é que é Amor. ◊

Pentagrama no 1 / 2017

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